James Lino é MC da velha escola e conhecido por suas rimas no Potencial 3, além da ativa participação e organização de oficinas e saraus na cidade de São Paulo.
O artista lançou recentemente o EP “Perseverança”, disco que traz rimas sobre trajetórias e valores do início do hip hop, mas que também trafega pela produção temática e instrumental atual, resultado do trabalho com seus parceiros Base MC, André Zigs e DJ Roger.
James Lino enxerga o hip hop pela lente social, em entrevista ao ZonaSuburbana, o MC fala de seu novo projeto, mas não foge de questões políticas. “Acredito que esta cena política vai acentuar o genocídio – não porque os movimentos sociais não estão engajados, mas porque a maioria dos movimentos também parece que tem indignação seletiva”, afirma o artista.
ZS: O que significa persistir e evoluir no atual hip hop, uma cena com tantas mudanças?
James Lino: Persistir é entender a necessidade de ler o novo sem esquecer o quanto aquilo que dizem ser antigo, velho ou oldschool representou e representa na construção de um cenário que, embora esteja no melhor estilo “torre de babel”, ainda tem potencial.
Sobre evoluir, eu vejo dois prismas: o primeiro é a evolução individual, que vai da sua busca. O segundo é a evolução coletiva, que nasce a partir de materiais de maior expressão como por exemplo, o evento dos 300 anos de Zumbi, independente da loucura que foi no dia (eu estava lá com o Potencial 3, e não era do grupo ainda!) foi muito positivo pro hip hop do Brasil. Assim como o Bocada Forte, a revista Pode Crê etc. A partir desta perspectiva, ambas as evoluções são importantes e necessárias para cena, pois quanto mais a gente entende como a cena é, mais a gente pode colaborar com ela.
ZS: O Base é um artista de uma geração diferente da sua. Como é sua relação com artistas mais novos? O que um pode aprender com o outro?
James Lino: O Base tem muito talento e é muito competente. Além disso, trabalhar com ele é muito gratificante, pois ele estuda, aprimora, evolui. Gosto disso. Confiei também no trampo do cara e ele me deu dicas. Gosto disso também, o futuro sempre será dos mais jovens, mas fiquei feliz de também agregar algo ao que ele já tem, foi da hora, e o EP taí. Eu trampo com o mais novos a maior parte do tempo, seja com as oficinas ou nos Saraus e batalhas, sempre sinto que sou respeitado e sempre respeito também, principalmente porque só eu e os que convidei (Sharylaine, Brechó, Zé Brown, Patrícia Cândido) para as minhas oficinas já viram quanto potencial tem neles. Eles são uma usina de criação.
Ouça o EP “Perseverança”
ZS: Tem acompanhado o que está rolando nos noticiários sobre os massacres em presídios?
James Lino: Tenho acompanhado o que a mídia traz. Nem sempre é confiável, e não li o que os movimentos trazem, eu confio bem mais em fontes como a Caros Amigos, Brasil de Fato, Diário do Centro do Mundo, mas, ao mesmo tempo, o que dizem é uma coisa, o que eles vivem lá é outra. Estou falando de cotidiano, neurose, alto grau de estresse, uma histeria coletiva que não tem tamanho, somados ao drama pessoal de cada um, crime, Estado, família, uma desumanização que eu, por mais que me esforce, não passo nem perto. Então eu tento ligar pontos tá ligado?
Superpopulação carcerária. + A maioria negra. + Genocídio do preto e pobre e indígena + Capitalismo selvagem + Políticos corruptos. + Guerra de facções, e por aí vai. Eu tento ligar os pontos, toda conclusão que eu chego é duvidosa, não vai ao X da questão.
ZS: Você está otimista com este 2017 em SP com Michel Temer, Geraldo Alckmin e João Dória?
James Lino: Nunca na minha vida eu pensei em viver um cenário tão desfavorável pro preto e pobre em geral. Falei com a Paula, minha companheira, que queria ir pro Canadá fazer um dinheiro por uns dois ou três anos, tamanha desolação nessa P***!!!
Ao mesmo tempo, e já falei com outras pessoas pessoalmente sobre isso, essa situação serviu pra gente acordar, ver que a política não é brinquedo, entende? Você votando ou não, acreditando ou não, os políticos vão influenciar sua quebrada, sua cidade e seu país. O mínimo que eu quero fazer é tentar através do rap e do hip hop entender melhor meu papel nessa sociedade e tentar informar, como venho buscando fazer ao longo dos anos. Nosso papel social, não só dos MCs ou ativistas, secundaristas, entre outros movimentos, vai além da ideia de trabalhador-consumidor.
Acredito que esta cena política vai acentuar o genocídio – não porque os movimentos sociais não estão engajados, mas porque a maioria dos movimentos também parece que tem indignação seletiva. Ou seja, vários na rua contra a corrupção e poucos na rua contra o genocídio da juventude negra, porque isso? Acredito que nossa moeda se tornará mais fraca, pelo pouco que entendo, a crise financeira é mundial e mais forte no ocidente, pois nunca na história da humanidade houve tanta desigualdade social. O colapso é inevitável, mas, curiosamente, acho que alguns setores vão bem, pois Temer, Alckmim e Dória, precisam empregar pra eles continuar fazendo esse teatro que vemos na mídia.