sábado, novembro 23, 2024

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Karen Santana lança “Encara-me” batendo de frente com seus conflitos internos e expondo a versão mais sincera de si mesma

Encara-me” surge como uma retomada de Karen Santana de sua própria narrativa e identidade. O som fala sobre autoconhecimento como chave para entendimento do próprio tempo universal, em busca do equilíbrio entre o que se é com o mundo em que se vive.

Marca a despedida de uma era, a era “Poderes de Évora”, a primeira parte da música ainda flerta com temáticas do último álbum de Karen, como a magia natural e esse mergulho que ela vem dando em sua vida para entender suas questões mentais, como funciona sua mente e mediunidade, foi todo um período mais nebuloso para artista, onde ela pôde acessar suas próprias sombras. Já a segunda parte do som é mais alegre, pra cima, marca esse novo tempo que ela está vivendo, que é um tempo de gozar dessas experiências de uma forma boa, de apreciar a maturidade que o mergulho anterior lhe deu, de mergulhar em outros campos mais doces, suaves e coloridos.

Além de um beat surpreendente que quebra na metade tornando da música praticamente duas, o som possui uma letra extraordinária e tocante, quase hipnotizante. Resultado de mais uma parceria da artista com o produtor musical e DJ Palazi.

O conteúdo profundo da composição é traduzido visualmente no videoclipe produzido por Sara Fernandes, Cauã Ogushi, Pedro Loiola, Beca Maciel e pela própria Karen. Na primeira parte do som vemos duas Karens em conflito num jogo de tensões sinestésico, produzido pela relação do tempo marcado do beat com o corte das imagens desse conflito entre Karens, intercaladas por cenas de uma Karen una, sentada à mesa concentrada escrevendo envolta por diversos elementos simbólicos que adicionam uma camada de solitude, invocação e entrega a esse caldeirão de tensão. A partir da quebra do beat passamos por um portal, a tensão se transforma numa leveza e graça venusiana, conhecemos outras Karens embaladas por um ritmo mais dançante e um tempo mais sereno.

Karen extrapola a condição limitante da dualidade, nos propondo uma espiral de múltiplas versões de si mesma. Para entender mais acerca da jornada que resultou nesse processo criativo tão lindo e complexo, convidamos a artista a responder algumas perguntas exclusivas:

Depois de ‘poderes de évora’ você ficou quase dois anos sem produzir, o que significou esse período de recesso para você e como você vê essa nova fase/temporada de lançamentos? 

Esse hiato de 2 anos foi um período extremamente difícil pra mim. Pois eu estava adoecida psicologicamente e no começo dessa pausa eu me cobrava pra produzir, pra lançar, pra estudar música mas sem condições financeiras e psicológicas se tornou um martírio essa cobrança. Até que obtive o diagnóstico de transtorno bipolar. E aí não me restou opção a não ser de fato dar uma pausa e uma chance pra conhecer essa versão de mim ocultada. 

Eu continuei escrevendo e produzindo, mas sem nenhuma intenção de voltar pra cena. As pessoas foram se afastando, o público que eu estava cada vez mais se afastando. Mas eu entendi que era um processo importante não só para me manter viva, mas que isso refletiria no meu som quando eu pudesse voltar. 

Culminou esse retiro com a pandemia. O que tornou tudo mais intenso. Muitas crises, resgate de memórias e um encontro ancestral com a minha família. Onde muitos também são bipolares e não tiveram a mesma chance de um diagnóstico. 

Hoje eu vejo esse hiato como necessário pra eu me enxergar como eu sou e não como eu quero me enxergar. 

Tenho mais consciência das feridas, dos gatilhos, do ancestral e consequentemente da minha real força e potência. 

Dj Palazi participou da produção do seu último single “Sol em Leão”, do atual lançamento ‘Encara-me’, e de outras faixas que você vai lançar ainda esse ano, você poderia falar um pouco mais dessa parceria?

O Dj Palazi é um grande amigo. Nos conhecemos há 11 anos atrás quando eu engatinhava no rap e ele já era uma criança grande no hip hop. 

Sempre vimos a potência um do outro. Quando o conheci ele ainda não produzia. Tocava em tudo que é baile. Sempre foi um DJ dedicado. E eu lembro de dizer pra ele que se um dia ele produzisse beat o bagulho ia ser louco. 

E tudo foi seguindo seu curso. Eu fui me desenvolvendo no rap, ele na produção, e no ano de 2021, depois de uma cota que ele já produzia, a gente decidiu fazer uma música. 

Eu desempregada sem dinheiro pra existir, colei lá no estúdio dele em Poá, fizemos a braba que nem saiu ainda. E a parceria não parou tudo que ele me manda, sai música. Ele é um cara que me ajuda a atualizar meu rap, a potencializar o que já tenho. Palazi é um cara muito antenado e muito melindroso no trampo. Eu curto isso, sempre fui muito boombepera raiz e ele me traz novos horizontes sonoros – do drill, do trap e timbres metálicos. É o bicho!

‘Encara-me’ no sentido literal da expressão é um convite para o olhar do outro recair sobre você, de qual maneira você gostaria de ser encarada?

Essa letra eu escrevi no início desse meu processo de pesquisa da minha mente. O transtorno bipolar e toda culpa que recai na gente faz a gente ser uma pessoa mansa. O rap me fez acessar minha potência de expressão. A arte faz isso, mas eu sempre fui muito quietinha em bando, observadora, silenciada por mim mesma. 

Naquela época eu já estava saindo do meu casulo e buscando menos julgamento alheio e mais observação, não só pra mim mas pra todes. A gente normalmente sempre tem uma visão distorcida de quem não fala o tempo inteiro sobre tudo, ou quem opina muito sobre tudo. 

Hoje, depois de quase 3 anos da primeira parte de “Encara-me” eu não sinto mais necessidade de ser vista e ouvida. Óbvio que com o meu trabalho musical eu almejo reconhecimento, mas isso é consequência da caminhada. E não tenho pressa. 

Hoje eu canto esse som na intenção de que as pessoas se olhem, se reconheçam pra que não dependam desse olhar do outro.

Você ouvinte quando canta “Encara-me” é um pedido seu para você mesmo. Já não tem nada a ver comigo. Acho que hoje é isso que ela quer dizer. São conselhos de alguém que aprendeu 1% do game afetivo. 

A faixa sugere uma ideia de “tempo”, sobretudo de aceitação e respeito do seu tempo pessoal, como o processo criativo da música contribuiu pro seu processo de autoconhecimento ou vice-versa?

O próprio tempo universal. Eu sempre sofri muito com ansiedade, sempre quis fazer tudo, conhecer tudo, realizar tudo. Desde criança. 

Mas nesse caminho eu entendi que meu foco, meu silêncio e sobretudo a minha calma tinha mais efeito do que a pressa, a correria. 

“Posso acelerar, gerando atenção e foco eu multiplico o tempo pra criar”

A gente muitas vezes se acha soberane à tudo, a todos e ao próprio movimento natural das coisas. E por vezes forçamos situações a nosso favor. 

A música fala desse caminhar sereno, sabendo quem se é e confiante de que todo plantar é ação calma e generosa. Ninguém sabe se vai germinar nossa semente. Isso aumenta nossa constância existencial e promove mais equilíbrio. Minha ansiedade agradece! 

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