DJ Fulano é vendido, MC Tal é traidor, rapper Sicrano é oportunista. Frases que são repetidas diariamente em conversas sobre rap nos picos, nas redes sociais, nos estúdios. Essa demonstração de repúdio aos artistas que estão conquistando independência financeira com o rap, uma criação das ruas, não é nova. Essa parada se repete.
JAZZ
Em 1925, nos EUA, a discussão que rolava no meio da cultura jazz era sobre a incompatibilidade entre arte e comércio. De acordo com jornalistas e historiadores, nesse período do jazz, certos músicos, fãs e comentadores afirmavam: o que era arte não poderia ser comércio e o que era comércio não poderia ser arte.
Louis Armstrong estava na mira dos críticos, mas não era o único. O tempo passou, artistas do jazz criaram várias vertentes, mas o sucesso comercial sempre foi visto com desconfiança. Benny Goodman, Stan Kenton, Cannonbal Adderley estavam na lista dos “suspeitos”. Na década de 80, Winton Marsalis, vencedor de várias edições do Prêmio Grammy, também foi alvo de críticas no meio jazz por ter uma enorme campanha estruturada por sua gravadora.
PUNK
Em 1986, o grupo Inocentes, um dos ícones do punk rock brasileiro, foi criticado por ter assinado contrato com a WEA para lançar o EP Pânico em SP. Chamados de traidores, até hoje são atacados. Os integrantes do grupo falam sobre essa parada no documentário que registra os 30 anos do Inocentes.
CONFLITOS
É grande expectativa criada por artistas que desenvolvem sua arte em meio ao caldeirão cultural que envolve resistência, protesto e novas formas questionadoras, seja na estética, no conteúdo das letras ou na forma de fazer shows. Quando a necessidade de expandir horizontes financeiros e aumentar o alcance de seus trabalhos fala mais alto, a cobrança é certeira.
Segundo James L. Collier, autor do livro Jazz – A autêntica música americana, “no jazz, como nas outras artes, não faltam pessoas para achar que se o músico fez dinheiro é porque muito honesto [em relação à arte] ele não deve ter sido.”
Sabemos que o show business domina e se faz necessário em várias situações, tendo em mente que a independência financeira proporciona a independência artística, mas também faz parte da engrenagem da indústria, onde as inovações são incorporadas e vendidas nas lojas e clones virtuais. Também sabemos como fica a situação de grande parte dos artistas que lutam contra essa lógica: vão para a gaveta, ficam invisíveis.
Por outro lado, artista que faz questão de participar do mainstream paga suas contas com suas músicas, vive seu sonho…mesmo sendo alvo de críticas, mesmo estando na categoria da arte “suspeita”.
Essa é a realidade de vários artistas do rap brasileiro. Querendo ou não, rappers sabem que vão colher os frutos e viver com as consequências das suas escolhas. Qualquer artista que leva o rap a sério já começa perdendo o jogo de goleada e sabe que a torcida pode virar de lado a qualquer momento. São poucos os que conseguem conquistar o respeito das ruas e estabilidade financeira.