sábado, novembro 23, 2024

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Protestando contra a misoginia, Lady Laay divulga vídeo de “DISSrespeito à Mulher”

Natural do Recife (PE), Lady Laay é MC, bgirl, grafiteira, analista de sistema, programadora e ativista atuante na cena do Rap recifense. Com muito o que dizer e lutando sempre pelo espaço das minas na cena do rap, Laay chega para divulgar a faixa DISSrespeito à Mulher” que conta com instrumental, gravação, beat, mixagem e masterização de Dj Novato.

DISSrespeito à Mulher” chega expondo situações fortes e experiências vividas pelas mulheres do movimento hip hop no Nordeste, e também Brasil a fora. A track chegou como uma voadora e saiu como uma mensagem de basta ao desrespeito que as minas sofrem não só no rap, mas na vida.

Na faixa, Laay questiona os boicotes que rolam com as mulheres nos eventos e produções, trazendo a tona a questão da visibilidade e do tratamento com as minas na cena. Além disso, DISSrespeito à Mulher” também traz relatos sobre a violência sofrida pelas mulheres, a falta de apoio e visibilidade nos trampos femininos e na visão machista da objetificação do corpo da mulher.

Uma das principais razões para a composição de DISSrespeito à Mulher” é uma resposta não só aos autores da famosa faixa Sulicídio” mas também a tantos outros artistas e homens em geral que utilizam de discursos e atitudes misóginas e preconceituosas. “O que culminou na minha decisão de fazer a track não foi a música “Sulicídio” em si, e sim as recorrentes atitudes e posturas misóginas dos autores e de vários outros”, afirma Laay.

No final de 2016, Laay também participou do NM Cypher #1, um projeto com MCs femininas representando diferentes estados do nordeste. A faixa conta com a produção de Crata $NAF e direção de Filipe Massa. Outros projetos no qual a rapper também faz parte, é o coletivo feminino PFC (Poder Feminino Crew) que vem trabalhando em seu álbum, intitulado SUBVERSIVA e a banca pernambucana RimatudeDiMina – A Banca.

Com todos esses projetos acontecendo, e a cena do rap nordestino sendo muito bem representada e crescendo cada vez mais, Laay também vem trabalhando em seu primeiro EP, AUDACIOSA” que traz novamente sua parceria com Dj Novato dessa vez assumindo a direção musical do projeto que ainda não tem data de lançamento, mas que promete trazer muito som pesado e representativo.

A MC conversou com o ZonaSuburbana e nos contou um pouco sobre a faixa, sobre a invisibilidade feminina no cenário do Hip Hop atual e principalmente sobre todo preconceito que ainda existe em relação a mulher dentro e fora do Rap. Leia a entrevista abaixo.

ZS: Sua trajetória no rap é registrada pela mídia local, mas não repercute muito nos blogs do hip hop brasileiro. Esta é mais uma barreira que precisa superar?
Lady Laay: Com certeza, e acho que é uma barreira que atinge não só a mim, mas a todas as mulheres do rap e demais elementos do hip hop. Vemos várias minas com trabalhos muito bons, mas que não tem a notoriedade e destaque que merecem, e que muitas vezes são até melhores que muitos dos caras que estão em destaque. Isso é decorrente do machismo que não só invisibiliza e escanteia, como também faz com que o trabalho das mulheres muitas vezes não seja nem ao menos ouvido, pois como digo na música: “Quando vê que é som de mina, nem sequer play dá”.

ZS: Na sua música “Dissrespeito à mulher”’ você relata uma série de fatores que provocam a invisibilidade da luta da mulher no hip hop. Tudo isso foi uma soma do que vive com o que os homens do rap continuam disseminando?
Lady Laay: Sim, todos os versos da música foram respostas a reais falas e atitudes que de fato aconteceram na vivência minha, e de outras companheiras. Não teve nenhum verso pra encher linguiça. A música foi um apanhado das coisas que tem acontecido desde sempre e que continuam a acontecer aqui em Pernambuco e em todo Brasil.

Como o som foi noticiado como resposta para “Sulicídio”, muitas pessoas questionam o fato de ter demorado tanto para responder. Mas aí é que está: o que culminou na minha decisão de fazer a track não foi a música “Sulicídio” em si, e sim as recorrentes atitudes e posturas misóginas dos autores e de vários outros, e a gota d’agua que aconteceu há dois meses, onde em um evento organizado pelos mesmos em uma ocupação contra a PEC, não havia nenhuma mulher na programação, e as próprias mulheres do hip hop e as da ocupação (mesmo as que não eram do hip hop), dias antes do evento acontecer, postaram na página do evento no Facebook questionando a falta de representatividade feminina na line, foi então que iniciou-se o discurso de ódio e misoginia disseminado pelos mesmos.

Disseram tudo que disse na música: que a mulher não tem espaço porque não tem qualidade, porque tem medo e insegurança, que não conhecem mulher no rap PE (ironicamente, no intuito de dizer que o trabalho de nenhuma presta), e que se quiséssemos tinha o microfone aberto (como consolo). Chegando o dia do evento, que em sua programação, além dos shows também tinha roda de diálogo, as mulheres foram em peso. Na roda de diálogo, propuseram um debate com os mesmos, cujo tema seria justamente o machismo e desrespeito contido nas atitudes, falas e letras de músicas deles, em que objetificam e insultam as mulheres.

E o que fizeram? Fugiram do debate, desligaram os microfones para silenciar as minas, e simplesmente encerraram o evento. Dias após o evento, o pai de um dos organizadores foi na página do meu grupo e fez um post em nosso mural nos insultando e tentando nos intimidar. Depois destes episódios decidi que tudo isso não poderia passar batido, não mais. Essa foi a real motivação de fazer a música.

ZS: As agressões contra mulheres praticadas por homens dentro do hip hop causaram revolta na cena, mas continuam se repetindo. Acha que falta uma ação efetiva e coordenada entre artistas e comunicadores independentes para denunciar e mudar essa realidade?
Lady Laay: Sim. Acho que cada vez mais as minas estão tomando coragem pra denunciar e explicar os fatos, e o principal: há um apoio das demais mulheres, sendo do hip hop ou não. Porém, isso ainda está ocorrendo apenas com a exposição dos agressores na internet. Na minha opinião, isso é muito importante, mas acho que além de expor na internet, as agressões deveriam ser denunciadas formalmente à Justiça para que possam ser punidos como merecem, e assim ter mais medo e receio de voltarem a fazer, além de servir de exemplo para os demais. Além de ser necessário a pressão das minas para que a Justiça não deixe os casos impunes.

Nessa parte da música em que falo da agressão, não pude citar nomes porque, apesar de ser fato inegável, por infelizmente não ter provas contundentes, eu poderia ser processada. Porém, muitas vezes, como nesse caso, o fato é de conhecimento de todos, mas passam pano por se tratar de caras que são amigos, famosos etc.

Isso até mesmo faz com as vítimas fiquem receosas, sintam-se não acolhidas, e intimidadas em denunciar. E outro motivo de não citar nomes é que isso é algo que não serve apenas para um, então quis deixar esse verso “aberto” para que vários vestissem as carapuças mesmo, para que todos saibam que boa parte dos caras que pagam de bom moço, são tão opressores quanto o sistema que dizem combater.

ZS: Dá pra ser mulher e MC e não falar sobre a luta feminista contra o machismo? É isso que muitos caras do rap querem que as minas façam?
Lady Laay: Enquanto houver machismo no hip hop será impossível não bater nessa tecla, pois se o rap é realidade e ferramenta para mudar esta realidade, não dá para deixarmos de falar sobre algo que de várias maneiras atrapalha, prejudica e agride diretamente e indiretamente as mulheres do hip-hop.

Mas não é que as mulheres vão falar apenas sobre machismo, temos muito mais a dizer, e inclusive já dissemos, várias mulheres tem sons sobre N temas. O problema é que somente os sons que batem de frente com os caras é que ficam conhecidos, os demais trabalhos sobre outros temas são ignorados.

Como por exemplo comigo, vi comentários de vários homens dizendo que já está chato falarmos disso, que o tema é clichê, mas quantos desses mesmos caras se deram ao trabalho de ir procurar conhecer meus outros trabalhos?

Se o fizessem, veriam que tenho músicas sobre o genocídio da juventude negra e periférica, racismo, desigualdade social, abuso de poder/violência policial, sistema, outro rap que aborda toda a problemática social que há por trás da dengue, zika, e chikungunya, que além de questão de saúde pública, é também uma questão de raça e classe, pois não é mera coincidência que majoritariamente os casos aconteçam nas periferias.

Entretanto, apenas os sons que batem de frente com os machistas é que ficam conhecidos, pelo fato de os incomodar e ser dedo na ferida. Se eles não conhecem nossos sons sobre outros temas, o problema é unicamente deles, é culpa deles.


COLABOROU: JAIR DOS SANTOS CORTECERTU

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