Na vida urbana em Curitiba a paisagem muda a toda hora. É um cenário de instabilidade, no clima e no humor, preenchido por incontáveis cenas, a maioria delas ofuscada pela liquidez de um tempo sem tempo. De nossas visões solitárias, colecionamos recortes de um espetáculo incompleto, sempre em movimento. A música do grupo Cena Paisagem retrata esse sentimento volúvel. É esse fluxo de consciência do ser urbano modulado pelo rap, por influências do jazz e da música brasileira.
O fim de tarde na cidade. O turbilhão do crepúsculo. Imagine a cena: pode ser iluminada pelos últimos raios do Sol, pode ter garoa, tempestade, você que escolhe. Dentro do carro, no sinal vermelho. Caminhando na calçada com os fones nos ouvidos.
Assistindo da janela de um prédio alto o movimento aflito das ruas cheias. Um beat na cabeça e um sentimento para expressar. O discurso surge e a paisagem começa a ser ilustrada.
“As cenas vão surgindo a partir de lembranças, conclusões, jogos de palavras que vão se encaixando.”, descreve Rodrigo Pinto, que faz as letras e dá voz ao grupo.
Com a participação do saxofonista Hudson Müller, “Lusco Fusco” traduz o desejo de mostrar que muito do que se vê na cidade acontece dentro de nós. O desenho do som começa com uma base simples. O produtor Kelvin de Souza propõe o tempo e a dinâmica e depois são trabalhadas as variações em cima da letra e do flow. “É importante que o instrumental reafirme o que está sendo dito. Faz da música um elemento único”, afirma Kelvin. Para o produtor, faz sentido descrever o som como jazz rap, mas sem restringir a esses dois gêneros. “Tem influências brasileiras, hip hop, soul, R&B, pop, indie. Isso tudo misturado dá o som do Cena.”, diz Kelvin.
O compositor Matheus Mantovani auxilia Kelvin nos arranjos e, ao lado de Rodrigo, dedica-se às temáticas e às letras. “No começo as músicas eram feitas de uma maneira mais individual. Me preocupava mais com os arranjos de violäo e guitarra. Quando eu e Rodrigo começamos a morar juntos, e com o Kelvin sempre aqui, o grupo passou a compor e escrever de forma mais coletiva”, conclui Matheus.
Os ensaios e as gravações acontecem nas alturas. O grupo transfigurou a casa em estúdio. Camas e armários dividem o ambiente com teclados, controladores, monitores de som, pedestais, microfones e outros instrumentos. O apartamento, no 13º andar de um prédio perto da Praça Rui Barbosa, também é sede do Onça Discos – selo criado para lançar artistas brasileiros “que näo têm medo de arrochar e botar pra torar misturando estilos”. A casa/estúdio é espontaneamente frequentada por compositores, músicos e artistas locais.
Ouça, “Lusco Fusco”: