É com imensa satisfação que hoje estreamos nosso novo quadro “ZENtrevista” de entrevistas! Produzido por mim (ZEN), o projeto será dividido em capítulos e consiste em entrevistar várias personalidades do rap nacional, apresentando um pouco do trabalho de cada um dos participantes, de modo a aproximar mais o público dos grandes nomes que fazem o Rap acontecer aqui no Brasil.
Pra estrear, ninguém melhor que Mahal Reis, carioca filho do ilustre Luiz Melodia, e grande referência pra mim e pra outros apreciadores da boa composição no rap. Mahal iniciou sua trajetória nos anos 90, lançando em 95 seu primeiro trabalho, o álbum “Aura”, divulgado por ele em rádios comunitárias do RJ, antes do fenômeno da internet e das redes sociais existirem. No decorrer dos anos, esteve ao lado de outros grandes nomes da velha escola da Lapa, precursores do Rap nacional e carioca.
Em 2006, Mahal lança seu primeiro álbum, intitulado “Cypha Sônico”. O álbum vem recheado de rimas complexas, lírica pesada, figuras de linguagem, recursos gramaticais, além de uma sonoridade bastante underground e diferenciada em relação a qualquer padrão anterior no rap nacional. Como não poderia ser diferente, “Cypha Sônico” acabou ganhando status de clássico com o passar dos anos, o que gerou muita expectativa em torno de novos lançamentos do MC.
Ouça na íntegra o disco “Cypha Sônico”:
Depois de uma pausa, Mahal retomou os trabalhos em 2016, anunciando o lançamento de um novo disco, o aguardadíssimo “ANIS (Aristocracia Natural Idiossincrática Sublime)”. Entramos em contato com ele para falar um pouco mais sobre rap, política, referências e sobre esse novo lançamento…
ZS – Você esteve um tempo distante da cena, a que se deveu esse distanciamento? Qual a motivação para o teu retorno?
Mahal: Fiquei 3 anos afastado da cena, cuidando da minha saúde. O retorno é motivado pela música em si.
ZS – Recentemente, surgiram alguns lançamentos, na verdade o relançamento de alguns sons do Cypha e outras novidades, fala um pouco mais sobre essa repaginada nos sons e relançamentos…
Mahal: Na verdade, as versões são as mesmas, só lancei ele oficialmente pelo Spotify, iTunes, e algumas plataformas digitais… Lancei também a “Logismo”, em uma nova versão, que vai estar no disco novo.
ZS – E o ANIS, qual a proposta do novo álbum? Quem são os produtores/beatmakers participantes? Alguma participação de outros artistas ou MCs nas músicas?
Mahal: A proposta é curtir com a sua galera, é um som pra curtir, extravasar, meio lounge, meio mafioso, tem mensagens poéticas, mas é principalmente pra curtir na night, no carro, no posto de gasolina, nas festas. Os Produtores são KR Beats, Djalma Gautama, Mestre Xim, Túlio Poik, Enecê e Renan Beats. Participam Donna Liu, ilustríssima voz de Salvador/Bahia,McMãe, C.Army, Dj Erik Scratch (Cartel MC’s) com vocal e scratchs, Don Nofi e Makaveli, parceiros da minha antiga área e Pinduka de Londrina/Sul.
ZS – Tu é conhecido pelo lirismo, letras complexas, numa tendência de composição muito semelhante ao Wu-Tang e outros MC’s, inclusive direto tu posta nas redes referências gringas pesadíssimas. Conta um pouco mais sobre tua vertente e tuas influências…
Mahal: Eu gosto muito de metaforismo lírico nas rimas, falar a palavra mais casual e crua, lidar com elementos corriqueiros de forma criativa e impactante, algo que envolva o subconsciente coletivo, palavras e imagens do cotidiano e marcantes na mente do inconsciente coletivo humano, e musicalmente curto muito a época do The Infamous do Mobb Deep, curto pegadas jazzísticas, underground, experimentalistas, soul, gosto de tudo com um swing e groove marcantes, Killarmy, as letras cientificas do Canibus, as analogias crônicas do Nas, gosto de elegância e distinção no Rap que faço, é por isso que primo sempre.
ZS – Me conta um pouco de como é ser Rapper e filho de um dos maiores ícones vivos da MPB, qual relação do teu pai com o que tu produz musicalmente? Ele é um apreciador do hip hop também?
Mahal: É um prazer ser filho dele, pois está arraigado toda a influência dele, poética e musical. É como uma nuvem de dados, que carrego na alma, ele curte muito o Hip Hop, e o que eu faço. É uma relação de apoio muito boa.
ZS- Apesar de ter um legado enorme e ser muito respeitado na cena, ao que me parece, você prefere ficar distante do estrelato, do mainstream, muito mais focado em lançar um bom material, do que no sucesso em si. Você tem interesse em fazer shows, ir pra outros lugares do Brasil? em surgir para o mercado? Ou o Rap permanece como hobby/necessidade pessoal?
Mahal: É o que mais quero quero agora, fazer muitos shows pelo Brasil, investir na minha carreira, com o dinheiro que for ganhando, ir montando um home studio, na real nunca me chamaram muito pra fazer shows, nunca entendi essa relação do público com meu trabalho, então, resolvi desencanar, e continuar produzindo, fazendo música pra divulgar minha arte, minha necessidade de legar formas de expressão e transcendência pro público.
ZS – O que tu tem ouvido de Rap nacional e gringo no momento?
Mahal: Nacional: Makalister, Quasimorto, Akira Presidente, Sain, e muita coisa que esqueci o nome e tenho pesquisado. Gringo: Wu-Tang, Mobb Deep, Nas, Oshun, Invincible Temple, entre outros.
ZS – Indica alguns livros e filmes pra gente…
Mahal: Filmes… Blade Runner, O vingador do futuro, Em algum lugar do passado, Krull, A Lenda. Livros… “O Lobo da Estepe” de Herman Hesse, “Ilusões” de Richard Bach, “A insustentável leveza do ser” de Milan Kundera, “Eu” de Augusto dos Anjos, esse do Augusto dos Anjos eu tirei muitas palavras pra enriquecer meu vocabulário.
Zs- Alguns artistas tem aparecido com referencias muito ligadas ao teu estilo, o próprio Predella usa a tua onomatopeia em alguns sons (dãdãdãdã!!!), me conta um pouco do que tu pensa da nova geração e da nova fase que o Rap nacional esta vivendo.
Mahal: Não têm como generalizar, mas acho a maioria dos sons da nova geração com uma preocupação imensa em ostentar status, falam da mesma coisa, ostentação de quem é mais foda, e esquecem da qualidade de criatividade nas rimas, acho tudo muito parecido ultimamente, todo mundo querendo fazer diss por qualquer coisa, difícil ter uma coisa que eu curta no momento.
Zs – Qual tua opinião sobre o atual governo?
Mahal: Um governo parasita, que sobrevive as custas da mão de obra barata do povo, e da ineficácia pra reais reformas no intuito de nos dar poder pessoal e arbitrário pra podermos escolhermos uma vida digna, através da infra-estrutura proporcionada, vejo um parasitismo do governo, e um abandono total do povo, quanto a educação,saúde,cultura e a estrutura social geral. Eles aproveitam esse deficit no nosso país, para se alimentarem do nosso desepero, nos prometendo falsas esperanças em troca de votos.
Zs – O que tu diria para os teus fãs e pessoas que admiram teu trabalho, para o ano de 2017?
Mahal: Galera, vamos correr atrás dos nossos sonhos, manter nossa capacidade de sonhar e realizar vivas, pois isso é o combustível pra vida e pro mundo. Espero em 2017 um ano de muita prosperidade, muito trabalho, sucesso e reconhecimento no Brasil e no mundo, Paz.